ah, to be a produtor musical e ter as habilidades para me expressar por meio da música!!! sei que muitas pessoas, em algum momento da vida, já sonharam em serem popstars e eu com certeza sou uma delas. há algo único na música, na arte. em uma cena de Jojo Rabbit (Taika Waititi, 2019), a mãe de Johannes fala sobre celebrar a vida dançando e ele responde:
– eu não vou dançar. dançar é para quem não tem trabalho.
sua mãe, em quase tom de sermão, diz:
– dançar é para quem é livre.
no geral, a catarse se manifesta em praticamente toda e qualquer obra de algum artista, é meio que inevitável, a não ser que consideremos catarse como algo muito mais intenso, para além da mera expressão “simplória” do que se sente. particularmente, eu amo quando o artista realmente faz o esforço de ser sincero com seus sentimentos e atravessa um processo de purgação nas suas composições, o que não é fácil.
quando algo de fato o perturba, colocar-se em um estado vulnerável, encarar e, de certa forma, vivenciar de novo aquilo, é muito dolorido. ainda mais quando se reconhece que erramos e continuamos errando. digo por mim, muitas vezes a vontade que temos é de esquecer, deixar quieto, ignorar até que suma. em dadas situações, remoer algo não é o mais saudável a se fazer, não a toa existem várias formas inconscientes de autodefesa, como o próprio esquecimento, a procrastinação, a projeção etc. não digo que quero que alguém sofra em prol do meu entretenimento, não me entendam mal! na realidade, é estar em sintonia com aqueles mesmos sentimentos, sejam estes de alegria, tristeza, raiva… e dançá-los. “dançar é para quem é livre”.
cada mês pareço estar apaixonado por trabalhos incríveis de artistas incríveis. quero conversar com vocês sobre e acredito que cada obra vai falar por si só. separei três álbuns recentes que, ao meu ver, são ótimos exemplos dessa catarse artística que mencionei. essa publicação, portanto, será dividida em três partes comentando os três álbuns individualmente. sei que não é o gosto de todos e talvez eu me empolgue no assunto, como quando aquela pessoa está conversando muito animada sobre algo que gosta com você, mas você já está com a bateria baixa e então responde apenas “uhum, aham”. pode ser que você pense um cansado “uhum, aham” em alguma parte dessa leitura.
vou tentar não me alongar muito sobre meus devaneios em relação às obras citadas, mas quero destacar aqui algumas partes de algumas faixas. lembrando! não sou de acompanhar tão minuciosamente os artistas que escuto, quero dizer, saber cada contexto por trás de cada música e/ou álbum lançado. sei de algumas informações e interpreto do meu jeito – de modo a incluir a tradução –, okay? na verdade, eu recomendo muito que você tenha a experiência de escutá-las!
Ego Death At A Bachelorette Party
(Hayley Williams, julho-outubro de 2025)
o rock é um gênero musical que combina muito com o ato de desabafar, ainda mais em conjunto a vocais emotivos e rasgados como os da Hayley. contudo, o trabalho solo da vocalista do Paramore tem baterias mais singelas, melodias simples, tampouco todas as faixas possuem performances vocais estrondosas, mas tudo isso funciona muito bem. eu gosto desse estilo meio silly com letras melancólicas, acredito que lembra muito a vida, sabe? sabemos que toda pessoa mais velha, do jovem adulto à terceira idade, tem suas bobices, apesar da pressão social em parecer ser o que não é. seguimos sem saber muito o que fazer mas continuamos tentando, até nos tornarmos um pouco mais confiantes em fingir confiança.
enfim, voltando ao álbum, é como se estivéssemos folheando páginas de um diário, as letras são bem pessoais e parece que estamos escutando os pensamentos da Hayley. pelo o que eu fiquei sabendo, as músicas foram lançadas soltas de surpresa em um site que permitia baixá-las e até customizar playlists. depois de um tempo, foi lançado nas plataformas como álbum, com uma ordem específica e uma capa só.
capa do álbum Ego Death At a Bachelorette Party
“Glum”
no raiar da sua luz do sol
nunca me senti tão sem graça
pensando que sou feita de luz da lua
não alcanço tão longe quanto, mas ainda me faço notada
procurando por alguém
persistindo até o amanhecer, me pergunto
você já se sentiu tão sozinho
que você poderia implodir e ninguém ficaria sabendo?
e quando você olha em volta e não tem ninguém em casa
mas você quer voltar para qualquer que seja o lugar que viemos?
[...]
a caminho dos 37
não sei se algum dia vou saber
que porra eu tô fazendo aqui
alguém sabe se isso é normal?
...
“Kill Me”
[...]
a filha mais velha vem para romper o ciclo
um trabalho que você nunca pediu está pagando “em poeira” (com nada)
aliviando o tormento da mãe da sua mãe
se salve ou nos dê espaço
porque, de qualquer forma, vivemos no seu sangue
vá em frente e me mate
não consigo ficar mais forte
arranje outro soldado, outro soldado
*essa aqui tem um trecho com uma voz gravada de criança falando “eu sinto muito que você esteja passando por algo difícil”.
...
“Love Me Different”
[...]
intermináveis horas de terapia
duas prescrições
nada de boa rotina
acho que sou eu que tenho que me amar distintamente
rolando o feed até 3 da manhã
Alex Lê Tarot me leu pra caralho
agora sou eu que tenho que me amar distintamente
...
“Negative Self Talk”
auto conversa negativa
uma veterana, autodidata
et cetera, de novo e de novo
cansada de escutar minha
autocrítica
a longa caminhada entre o carro e a casa
eu apenas sento atrás da roda
até a bateria descarregar
casa é onde éramos barulhentos
[...]
agora é tão quieto
[...]
escrevo como um vulcão, expelindo de uma vez
mente quieta é um canhão carregado
para quem está apontado agora?
[...]
cantei por cima dos nossos ossos
hm, palavras giraram em rodas de margaridas na minha mente
eu sou Vasalisa, me guie através da noite
nada mais irá entrar em mim além de luz
*amo essa ponte, amo o processo de autocrítica, logo depois a expressão artística e, como "resultado", a recuperação.
...
“True Believer”
[...]
todas nossas boas memórias
foram compradas e transformadas em apartamentos
[...]
eles posam em cartões de natal
com armas tão grandes quanto suas crianças
eles dizem que Jesus é o caminho
mas eles deram a ele um rosto branco
pra eles não terem que rezar para alguém
que eles julgam como inferior a eles
o Sul não irá ascender de novo
até pagar por cada pecado
[...]
acho que já tá bom por aqui, né?
todas as letras destacadas me parecem conectar com a temática da catarse. como antes comentado, é um processo dolorido. imagina compor, cantar e escutar, repetidas vezes, que você se sente mal em relação a si mesma quando alguma pessoa extrovertida e que parece bem resolvida está por perto? porque te lembra da situação que você se encontra, do medo que você sente, da sua solidão, de estar perdida e não saber o que fazer. que você tá cansada. que você quer ser verdadeiramente amada mas não demonstra o amor que quer consigo mesma. você reconhece os problemas que partem do interno e do externo, nem todos você pode resolver sozinha, alguns estão bem fora do seu controle e os que você tem maior possibilidade de mudar não são fáceis. saber disso te dói.
no momento que isso é posto à mesa, isto é, assim que todo esse caos é comunicado ao invés de só internalizado, você percebe que muitos já sentiram ou sentem algo parecido, que a consciência da sua posição também te cura e isso se estende a outras pessoas. quase como em uma projeção astral, você distanciadamente observa tudo ali na mesa, no caderninho de anotações, na sonoridade, na voz, e, de repente, tudo está tão claro. o espaço está tão mais perceptível e as pessoas que se encontram nele, agora, também percebem isso. até aquele alguém que você não imaginava passar pelo mesmo! e esse alguém diz que também achava isso de você! tal qual uma sala de espelhos. a teia humana que nos interliga.
observações: acho “whim” bem taylor swifticada kkkkkkk parece muito uma música que a taylor cantaria. “mirtazapine” é sobre um antidepressivo. a faixa título tem várias camadas, assim como o álbum inteiro, não dá pra comentar tudo apesar de querer muito! “ice on my oj” tem sample da banda cristã que a hayley já fez parte, “discovery channel” também tem sample mas de uma música techno dos anos 90, “the bad touch”. “hard” tem um sozinho de telefone tocando a partir de 15s. “true believer” referencia a música “strange fruit” do billie holiday sobre discriminação racial. o nome Vasalisa citado em "negative self talk" faz referência a um conto de fadas russo, muito lindo por sinal. minhas favoritas por agora são “negative self talk”, “hard”, “true believer”, “blood bros”, “i won't quit you” (linda demais) e “parachute” (amo a parte falada e gritada dessa, a emoção crua), mas eu não costumo pular nenhuma!!!
próxima parada...🌺☀️🌈